segunda-feira, 18 de julho de 2011

Sou vagabunda, eu confesso

 
Para mim, a Marcha das Vadias começou em casa. Como dizem, sou uma pessoa de gosto simples para roupas, sempre usando calça jeans, camisa e tênis fuleiro. Mas a marcha pedia mais de mim, mais feminina, mais tchan e, por isso, coloquei uma saia preta curtíssima cobrindo a cinta-liga, com uma regata branca, com uma sapatilha: um look básico. No entanto, já em casa, a minha mãe começou com as prevenções: “Mayara, vão mexer com você na rua”, “você não vai sair de cinta liga!”, “coloca outra roupa!”. O que eu fiz? Abri o portão e enfrentei o vendaval de Curitiba.

“Se o Papa fosse mulher,

Se o Papa fosse mulher,
Se o Papa fosse mulheeeeeer,
O aborto seria legal,
Seria legal e seguro,
Seria legal e seguro”.

Após cantadas na rua e olhares de revés cheguei no Passeio Público onde um grupo de pessoas erguia cartazes, folhas, banners com dizeres como “Meu corpo, minhas regras” ou “Por prazer ou por profissão, sexo não é um convite à violência” levantando os papéis em direção a um céu azul de manhã de sábado. Lá estavam homens, mulheres, jovens, velhos, integrantes do LGBTH (o H também, por que não?), desocupados, espectadores, feministas, punks (tinha todo tipo de gente desfilando em meio aos flashs).

"Sim.

Eu sou vadia,
O imposto me come todo dia"

O carro de som ia guiando o pessoal da praça da Mulher Nua (nome adquirido pela Praça 19 de dezembro durante a Marcha das Vadias), até o Largo da Ordem, depois até o Praça Generoso Marques e, no fim, na Boca Maldita. A cada parada da longa e glamourosa caminhada, representantes de instituições e movimentos de defesa e proteção dos direitos humanos falavam sobre respeito e direito à liberdade usufruir a vida como quiser. O presidente da ABGLT, Toni Reis, esteve no comecinho do evento parabenizando a marcha e defendendo a existência de políticas públicas de respeito.  "Como disseram aqui, 'Feminismo para frente e o machismo para trás', porque a homofobia é causada pelo machismo, sim", segundo Toni Reis – e segundo eu, também, pois concordo plenamente com esse comentário.

“Ôooô, piada de salão,

Maconha é proibida, mas homofobia não”

De todas as falas sobre todos os direitos a que mais me tocou foi a sobre racismo, pronunciada por uma representante do movimento dos negros, que no final da fala aplacou todas as mulheres. “Mulheres negras, mulheres brancas, mulheres polacas, que carregam latas d’água, carregam a roupa, carregam a casa, carregam os filhos, carregam a culpa do mundo. Sabe? Vamos tirar essa culpa do mundo, gente. Nós estamos aqui para sermos felizes”. Porque, afinal, a cada 24 segundos uma mulher é espancada nas terras tupiniquins.  Até quando as mulheres serão ditas e tidas como responsáveis pelos crimes que vivenciam? O que vestem, com quem andam, com quem namoram, não são sinais verdes para estupro físico ou verbal - ainda mais que, como dizia uma das marchinhas, "o corpo é da mulher, ela dá para quem quiser".


Pode dizer que é frescura, que a mulher já ganhou mais do que perdeu desde que queimaram sutiãs em praça pública. A única coisa que tenho a declarar é que quando voltei para casa, eu em meus trajes de vadia simples, fui parada por um cara no tubo de ônibus. “Moça, eu pago (a passagem) para você”, “Não precisa, muito obrigada”. Rodei a catraca e ele parou ao meu lado, “Eu pago para você”. Saí de perto dele, ele voltou, ele disse “eu pago” se aproximando do meu rosto. A vontade era perguntar, “vai pagar o que?”, mas o receio da resposta era maior. Bem, que pena que ele não estava na marcha. Perdeu uma grande lição sobre respeito à mulher – e a ele mesmo.

Fotos por Mayara  

Para o próximo post teremos alguns vídeos da marcha. Até logo! 

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