quarta-feira, 29 de junho de 2011

Mortal Kombat, Street Fighter, KOF e homoexclusão



Mortal Kombat, Street Fighter, KOF e homoexclusão
(por Zé Roberto- da comunidade LGBT Brasil do Orkut)


Quando comprei Mortal Kombat Armageddon soube que era possível criar personagens. Na mesma hora eu pensei: “Linda! Vou fazer um personagem travesti para chocar a comunidade!” . Fui obrigado a jogar horas a fio para ganhar “moedas” suficientes e comprar roupas para os meus personagens. Quando consegui, fui lá fazer meu personagem. Decepção! Simplesmente não era possível colocar roupas femininas num lutador masculino! :-O

Fiquei pensativo e reflexivo. Não somente pelo aviltamento do direito de eu vestir meu personagem da maneira como eu quiser , como também pela questão de que muitos personagens de vídeo games preenchem 100 % papéis heteronormativos. A maioria deles são todos homens e mulheres extremamente masculinos e femininos, respectivamente.

Tudo bem! Sei que estes jogos querem vender uma imagem de perfeição, de força, de potência e os estereótipos de homem e de mulher preenchem estes requisitos. (Como se não pudesse haver um “modelo perfeito de gay ou lésbica!) O problema aí é a exclusão total de LGBTs deste universo. Pensei nos meus jogos prediletos – Mortal Kombat e Street Fighter. Não há personagens LGBTs assumidos.

Comentei com um amigo meu sobre isso e ele me disse que “minha vida gira em torno da causa LGBT e que eu estava vendo pêlo em casca de ovo ”. Impressionei-me como é que a heteronormatividade é naturalizada de tal forma que ao questioná-la, as pessoas simplesmente não te acompanham. Às vezes eu tenho a impressão de que gays e lésbicas (principalmente os afeminados e as masculinizadas) não se importam de não serem representando em lugar algum. Acham normal todos os personagens de games serem homens masculinos e mulheres femininas.

Esse debate suscita questões interessantes, como a diferença entre homofobia e homoexclusão.

A homofobia caracteriza-se por um discurso de ódio, uma violência e uma discriminação, opiniões tortas e irrefletidas. Ela é ruim. Mas a homoexclusão é tão prejudicial quanto a homofobia. Dá aos LGBTs um sentimento de inadequação, de não pertencimento à humanidade, de que sua existência é completamente anormal (num sentido qualitativo). Ela é cruel porque naturaliza os heterossexuais como regra absoluta. Além disso, ela tira dos heterossexuais uma consciência social de pluralidade e diversidade de existências humanas , o que os torna extremamente chapados, intolerantes e com sentimentos de presunção, superioridade e petulância com relação à si próprios.

Dizer que a exclusão de personagens LGBTs de muitos games é “acaso”, é balela pura. Em The King of Fighters , por exemplo, temos personagens LGBTs clássicos como Vice (?), King, Benimaru, Iori (tem uma certa androgenia). Nesse sentido, há, a meu ver, um problema cultural entre EUA e Japão. Os jogos que tem influência japonesa tem mais abertura a estes personagens. Já jogos 100 % americanos (como Mortal Kombat) são totalmente heteronormativos.

O jogo Street of Rage III, há alguns anos atrás, quando feito por japoneses, lançou o personagem Ash , um estereótipo da bicha norte-americana sadomasoquista. Batia MUITO! Na versão americana ele foi retirado por causa do medo de que alguns pais reclamassem de que um personagem gay pudesse influenciar seus filhos.

O mais engraçado dessa imbecilidade é que trata-se de jogos da mais pura violência, com cabeças decepadas, braços arrancados, dentes para fora, tiros de toda forma , mas que exclui personagens LGBTs como forma de proteger as crianças. A sociedade só pode ser doente! Eu queria realmente entender que poder é esse dado aos gays, maior do que a mais pura e doentia violência dos jogos de vídeo game.

Ora, mas por que ter personagens LGBTs é importante? Simples! Porque eles têm penetração entre crianças e jovens, que ao tomarem contato com a diversidade de gênero e de possibilidade de manifestações de elementos masculinos e femininos , passam (em tese) a ser mais tolerantes ou a compreender que as pessoas não têm que ser todas iguais e que LGBTs são parte do mundo (ainda que sejam “errados”, mas pelo menos eles existe!).

Os fanáticos religiosos sabem que no dia em que educarmos as crianças, seus fundamentos homofóbicos deixarão de existir e não precisaremos mais punir os adultos. Daí a reação contra o kit contra a homofobia. É na educação de base que mudamos a sociedade.

Infelizmente isso é visto como uma forma de incentivar o “homossexualismo” (sic). Seja como for, essa tendência nos jogos eletrônicos tem mudado consideravelmente. Encontramos personagens LGBTs em vários games, o que é muito bom! Mas ainda assim essas iniciativas são tímidas. Seja como for, este debate serve para nos fazer refletir sobre o impacto da homoexclusão, da naturalização da heternormatividade dos próprios LGBTs e do incrível poder que é dado à homossexualidade e da pluralidade de gêneros, maior que o da violência cabal dos games.

Muitos negros passaram a exigir sua presença em filmes. Judeus resgataram seu papel para a humanidade. Africanos têm mostrado que o berço da humanidade é ali e exigem seu papel nos livros de história. Mas é triste constatar como LGBTs acham perfeitamente normal um lugar (um jogo ou qualquer coisa) sem sua presença. Acostumamos-nos a sermos invisíveis . Lamentável.

Amor e Paz

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