terça-feira, 28 de junho de 2011

No meio do caminho tinha um muro...

Artigo que escrevi a alguns anos atras sobre o histórico e subversivo 28 de junho de 1969. Uma boa oportunidade para relembrar nossos heróis.





"No meio do caminho tinha um muro"
(por Dorothy Lavigne)

Ha momentos, na longa caminhada humana, e mais exatamente na sua contemporaneidade, que costumam ser abandonados, uma vez julgados e condenados pelo tenebroso Tribunal da Historia, e seus heróis, principalmente os anônimos, punidos por aquela à qual Camões designou em sua obra magistral como a "Lei da Morte", a saber, o esquecimento. O titulo deste segundo artigo, mais que uma paródia ao famoso poema de Drummond, é uma alusão a um destes momentos-chave, que nunca está presente nos livros e atas históricas, apagados da lembrança da maior parte da sociedade; mesmo tratando-se de um marco único em um processo social que, ao partir de um determinado segmento e tendo como foco o mesmo grupo, acaba por atingir indiretamente a totalidade das construções e interações sociais.
Mesmo correndo o risco de parecer -ou, de fato, ser- por demais acadêmica, gostaria de apresentar um recorte de jornal como introdução pertinente(uma boa fonte é sempre bem-vinda):


"De repente, o camburão chegou e o clima esquentou. Três das mais descaradas travestis - todas em drag - foram empurradas para dentro da viatura, junto com o barman e um outro funcionário, sob um coro de vaias da multidão. Alguém gritou conclamando o povo a virar o camburão. Nisso, saía do bar uma sapatona, que começou uma briga com os policiais. Foi nesse momento que a cena tornou-se explosiva. Latas e garrafas de cerveja começaram a ser atiradas em direção às janelas e uma chuva de moedas foi lançada sobre os tiras..."
(2)



Observemos os fatos: havia na decada de 60 vários bares destinados então ao segmento GLS no bairro novaiorquino de Greenwich. Era bastante comum e corriqueiro (na verdade uma norma) que houvessem batidas e inspetorias policias nestes lugares, por uma séries de pretextos- geralmente falta de licença para venda de bebida alcoólica. Estas intervenções geralmente acabavam com o fechamento do estabelecimento e apreensão das bebidas, e de "todos os que se encontravam travestidos". Na madrugada do dia 28 para 29 de junho do ano de 1969, porém, ao praticar o ato já costumeiro e prender alguns travestis (3),num bar da região chamado Stonewall Inn, a força repressora teve uma grande surpresa: os clientes do local resolveram resistir em solidariedade aos amigos. Logo o bairro transformou-se um palco-de-guerra, quando os homossexuais e trangêneros resolveram armar barricadas e, no ápice da revolta, prenderam os policiais dentro do proprio bar e passaram a incendia-lo.
Os soldados conseguiram a muito custo escapar, mas, ao voltar no dia seguinte, encontraram uma série de pichações e cartazes pedindo, pela primeira vez na historia, respeito e igualdade de direito. Tal episódio tornou-se conhecido como "A Batalha de Stonewall" ("Stonwall Riot") e é o mais significativo ato da militância LGBT, ao passo que marca oficialmente o inicio de um movimento organizado. É por isso que o dia 28 de junho é mundialmente saudado como Dia do Orgulho,
porém um dia de conscientização e confronto, não à mesma maneira de 69, pois mudou-se o contexto.
Mas ainda há muito espaço para conquistar. Ainda há muitos pedaços que restaram dentro de nós daquele pequeno e ao mesmo tempo enorme Muro de Pedra do suburbio de
Nova York.


Quer saber mais?
http://www.esquerda.net/dossier/batalha-de-stonewall-marco-do-movimento-lgbt

NOTAS:
1-Artigo apresentado no jornal "O Grito" do CAHIS (Centro Acadêmico de Historia) da UFPR, edição de nº2, Novembro de 2008.
2-Trecho do jornal "Village Voice", por ocasião do fato.

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