sábado, 18 de setembro de 2010

Curitiba: A Parada mais simbólica do Brasil

(por Dorothy Lavigne)




Parafraseando o presidente da Appad, Marcio Marins, que diz que a Parada de Curitiba é a mais politizada do pais, este artigo é um esboço de um discurso “inflamado” que infelizmente não poderei pronunciar do carro de som. Imagem uma “trans” falando no microfone do carro principal, abstraiam.

Todos os anos, depois da contagem regressiva, quando milhares de pessoas saem em direção ao Palácio da Alvorada, fico extremamente emocionada. Primeiro por entender a importância política do ato a que estou me juntando. Segundo por perceber a simbologia que está por trás de cada passo que damos durante o percurso.

A idéia de transferir o desfile LGBT que antes partia da frente da UFPR, com destino à Boca Maldita, espaço físico tradicional de debate livre entre os cidadãos de nossa cidade, para o Centro Cívico, foi uma mudança extremamente feliz. Nosso desfile cívico inicia-se numa praça chamada 19 de Dezembro. Pra quem não sabe o dia 19 de dezembro de 1853, é um marco importante, pois é a data em que nosso Estado se emancipa de São Paulo, ou seja, para os paranaenses, a praça representa a tal sonhada Liberdade.





Ornando a praça temos duas estatuas, representando um casal despido, e que acabaram por dar o carinhoso apelido ao lugar: Praça do Peladão. O que pouco gente sabe, mas é muito fácil de se imaginar, a que a idéia de colocá-los em praça publica, causou enorme polêmica na época, na verdade, pode-se observar que as obras têm tamanhos diferentes e são confeccionadas com técnicas diferentes. O homem, bem maior que a mulher, é formado de vários blocos,encaixados depois, e a mulher é feita num bloco só. Quer dizer que não foram criados inicialmente para estarem juntos, mas para ornar lugares diferentes. A estátua feminina, ate onde me consta, ficava na frente do Palácio de Justiça, a outra estátua eu não sei.

Ora, a Praça do Homem Nú é, portanto um símbolo de libertação: política e social. Quando nos concentramos nesse lugar, celebramos “de cara”, a união por um ideal, o direito de estarmos nus, despidos de preconceitos e sendo nós mesmos. Festejamos a futura “Emanipação Homossexual”. E com a certeza de que aquele espaço físico (a praça) representa uma vitória da população curitibana contra o preconceito. Representa o momento que o povo abandonou parte do pudor e as famílias aceitaram a nudez descarada do casal de pedra, que acolhe como pai e mãe muitas crianças que vêm brincar na praça, algumas sem ter o calor de uma família.

O momento crucial no nosso ato publico é quando se faz a contagem regressiva e se canta o Hino Nacional. Ora estamos nessa hora fazendo uso de nossa cidadania. Não estamos apenas dizendo que somos cidadãos, mas já possuídos de espírito cívico, atuamos como tais. É nessa hora que tomamos posse da cidadania.
Quando nos dirigimos ao Centro Cívico, não fazemos um simples passeio. Antes vamos bater simbolicamente a porta do governador para exigir como cidadãos, nossos direitos e deveres.

O Palácio da Alvorada, como qualquer outro edifício publico, representa o poder que esta por trás dele. Representa o inimigo a ser vencido, os obstáculos criados pelo sistema. Quando batemos a porta do senhor governador, estamos , aos mesmo tempo , simbolicamente encarando de frente todos os políticos que nos negam direitos básicos. Este ano de 2010 há um detalhe que torna a chegada a Praça N.S. de Salete (onde fica o edifício) ainda mais emocionante: como o prédio está em obras, o que veremos é apenas uma “carcaça”. Simbolicamente, os obstáculos desta vez estarão derrubados, nossos adversários não estarão por lá, pois “fugiram”.

Termino opinando que antes de uma festa, a Parada é uma vitrine da Diversidade, é um espaço no qual aqueles que são obrigados a ficar “no armário” durante todo o ano têm a chance de se libertar, é o lugar onde (infelizmente só por uma vez no ano, ainda) as pessoas “da noite” podem sair durante o dia. É a concretização de um sonho que espero estar cada dia mais próximo de se realizar, mas que ainda continua muito distante. Mas cada passo que damos simbolicamente em direção aquele prédio abandonado (e vários outros que encontramos em nosso dia-a-dia) é um passo a menos que nos separa de nossa tão sonhada Liberdade.

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